Jack
Kerouac foi um dos maiores escritores beats, talvez o mais famoso. O trabalho
que vem à mente da maioria das pessoas, e da minha também, quando alguém
pergunta sobre Kerouac é On the Road
- porém, os fãs mais radicais dizem que Os
Vagabundos Iluminados é o romance mais bem-feito.
Para
falar a verdade, são histórias com espíritos tão parecidos que um/a leitor/a
desatento/a pode pensar até que está lendo o mesmo livro. Mas existem
diferenças claras e é basicamente disso que se trata esta resenha. Comecemos
por admitir que a afinidade mais clara é o empolgante e poético zen-budismo que norteia a vagabundagem
das tramas.
Sinopse
Ray
Smith, o narrador-personagem, é um escritor relativamente iniciante que está
sempre disposto a fazer tudo - escrever, pensar, viajar - guiado um fluxo de
pensamento febril, quase delirante. O zen-budismo é a sua filosofia de vida,
mas, como não existe uma doutrina que estipula o que um zen pode ou não pode ou
deve fazer, ele vive com imensa liberdade, tentando aprender com cada uma das
suas experiências incertas.
A
referência espiritual de Ray é o Japhy, outro zen-budista com personalidade
própria e sem a mesma pureza celibatária do protagonista. Japhy não tem um
código de moralidade quase cristão, pelo contrário, ele vive para curtir e
gastar toda a sua energia inesgotável trabalhando como lenhador e se enchendo
de bebida nas festas que organiza em sua casa, no meio do mato.
Ray
sempre encontra boas razões para viajar. As viagens são formas de aguçar a sua
espiritualidade e de sentir a vida por um fio. É um caroneiro bem ao estilo dos
personagens de On the Road. Entretanto,
o que busca não só Ray, como Japhy e Morley (um aventureiro atrapalhado e muito
engraçado, nas cenas hilariantes em que aparece), é a razão de existir na
terra. Uma busca mais espiritual do que em On the Road. São personagens mais
calmos, que vivem uma loucura lúcida à procura do resgate da espiritualidade e
de um bem que não se sabe exatamente o que é – algo como a busca do vazio
budista.
O que ficou do que passou
A
forma de escrever tanto do Kerouac quanto de Ray é notável por causa de um
fluxo de consciência genial e interminável, mas às vezes, confesso, dei uma
pausa para respirar e assimilar aquelas frases gigantescas. Os diálogos são
fenomenais, muito divertidos e quase inigualavelmente vívidos, traduzindo de
maneira muito enérgica o que aquelas pessoas poéticas conversavam.
Já os personagens se diferenciam de On the
Road por serem menos radicais na forma de viver. Continuam verdadeiros monges
budistas, porém abdicam menos das coisas materiais e vivem com normalidade em
alguns aspectos. Resumindo, só o protagonista continua um vagabundo
completamente iluminado e abstêmio.
Bom,
sinceramente não concordo com a opinião de que este é o melhor romance de
Kerouac. Talvez tecnicamente sim, mas, como não entendo disso, fico com a
empolgação gigantesca proporcionada por este livro. É uma loucura sábia e
intrigante. Não a maior empolgação que já tive lendo Kerouac, mas o livro com
que mais aprendi. Indico fortemente a leitura deste livro: uma fluidez que não
permite sombra de chatice.
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