Título: Frankenstein
Autora: Mary Shelley
Editora: Zahar
Páginas: 256
Lançamento: 01/01/1818
Talvez seja impossível saber se Mary Shelley tinha
consciência do sucesso que a sua obra-prima faria. Será que ela previu que, com
Frankenstein, partindo do romantismo, inauguraria um dos gêneros mais instrutivos e empolgantes da
história da literatura? Mais além, será que ela sabia que os primeiros
escritores que se aventurariam ganhando a vida com ficção científica seriam
relegados à folhetins e revistas “vulgares”? Que teriam um início duro e
marcado pela difamação de uma elite acadêmica?
Uma possível resposta, pelo menos para a última questão: ainda bem! Assim, tivemos o legado de histórias escritas por pessoas
simples, ou até por intelectuais, refinados ou não, que pensavam fora dos
cânones fúteis da literatura, que conseguiram ativar e congregar a imaginação,
o maravilhamento, os anseios, as esperanças e os pesadelos provocados pela
modernidade, como nenhum outro gênero.
E por falar em modernidade, Mary Shelley desenvolve um
protagonista originado nos mitos gregos e dá uma inovadora roupagem científica a ele.
É uma releitura do mito de Prometeu, o filho de Zeus responsável pela criação dos
homens. Agora, Frankenstein usa a ciência, e não os poderes, para dar um sopro
de vida numa criatura humanóide. Ele é o Promoteu moderno, título alternativo do livro.
O
mundo do século XIX, pelo menos o mundo europeu, estava marcado pelo avanço da ciência como hoje a conhecemos. E a literatura, como de costume, expressa muito bem os
sentimentos de uma sociedade. É o contexto que serviu de inspiração para Mary
Shelley, que também demonstrou abertamente a influência do terror gótico
alemão.
Sinopse
O livro, escrito em primeira pessoa, é a transcrição das
cartas que Walton envia à irmã. Walton é uma espécie de cientista aventureiro. Ele
escreve as mensagens nas proximidades do Polo Norte, em sua viagem mais
ambiciosa, com objetivos que não são claros. Tá legal, mas onde entra o Frankenstein?
Depois de uma vida de fracassos científicos e de muito
esforço, Walton consegue um navio e embarca, com os poucos marujos que
conseguiu recrutar, para uma viagem que ultrapassaria os limites então
conhecidos. Sua aventura pretendia revolucionar as fronteiras geográficas do
conhecimento humano. Chegando num lugar quase letal, onde a embarcação manobrava
por entre imensas calotas polares, a tripulação avista um trenó (!) ao longe.
Como seria possível que esta região inóspita estivesse sendo explorada por
humanos? E olha o veículo: um trenó!
Eles avistam uma gigantesca silhueta disforme, que
rapidamente desaparece. Estranhados, os tripulantes surpreendem-se no outro
dia, quando novamente avistam um trenó com uma pessoa. Mas ela não é tão
gigantesca quanto no dia anterior. É apenas um humano como qualquer outro,
muito enfraquecido, num estado de quase-morte. O nome da pessoa é Frankenstein. Apesar de sua fraqueza,
a sua eloqüência e conhecimento científico não demora a despertar um profundo
fascínio em Walton. Frankenstein, então, começa uma longa narrativa, contada de
pouco em pouco, sobre o que o levou até aqueles confins.
Juro que, como de costume, não estou revelando nada
demais sobre o enredo, de modo que você pode continuar a leitura sem medo.
Frankenstein é filho de um rico comerciante de Genebra. Ao concluir os estudos básicos, ele vai estudar medicina na Suíça. Seus professores logo percebem a sua capacidade hiperbólica, especialmente em química, física e anatomia. Seus estudos incessantes lhe garantem uma erudição fora do normal.
Frankenstein é filho de um rico comerciante de Genebra. Ao concluir os estudos básicos, ele vai estudar medicina na Suíça. Seus professores logo percebem a sua capacidade hiperbólica, especialmente em química, física e anatomia. Seus estudos incessantes lhe garantem uma erudição fora do normal.
Não demora muito para que Frankenstein ponha todo o seu
brilhantismo num audacioso projeto: trazer um homem à vida. Começa a sua trajetória de Prometeu. O seu relato se
baseia na sua incapacidade lidar com a criação que motivou a sua existência, uma
criatura extremamente sensível e inteligente, mas horrenda; uma obra-prima
sobre a qual ele se debruçou com uma inesgotável energia e que definiu os rumos
da sua vida.
----------
O
que ficou do que passou
Como amplamente aceito, Franskenstein é uma obra de
ficção científica. A primeira. Mas podemos ir além. Tratando-se de Sci-fi, é
também a primeira das distopias. Shelley nos mostra a crua possibilidade de que
os incríveis inventos que caracterizam a modernidade, supostamente capazes de
nos trazer a concretude dos nossos sonhos, não significam a certeza do
contentamento, a plenitude da criatividade.
Eu tinha várias considerações a fazer sobre o monstro.
Mas não quero revelar nada demais sobre o enredo, o que é sempre do meu feitio
e também deveria sê-lo nos prefácios e sinopses das editoras etc. Limito-me a
dizer o quanto fiquei movido com a sensibilidade, inteligência e solidão da
criatura. Aliás, o ponto alto do livro é justamente os seus pensamentos, suas
atitudes e sua aguda capacidade de obter conhecimento de mundo de forma
autodidata.
A incrível habilidade e precisão de Shelley com as
palavras merece ser ainda mais difundida. Faço minha pequena contribuição com
esta despretensiosa resenha. Sei que virão muito mais divulgações maravilhosas,
porque o que é bom merece ser conhecido. E também tenho a triste impressão de
que alguns clássicos, como Homero, por exemplo, são tão conhecidos que ninguém
os lê de fato (eu mesmo nunca li este. Até já tentei, mas não compreendi).
Não se pode relegar Frankenstein a um clássico sem leitores. Para os amantes da literatura, e até para os que não o são, é perceptível o quanto este campo foi dominado pelos homens. O letramento sempre foi restrito às elites. E dentro das elites, para os homens. Shelley rompe esta barreira e abre caminho para o gênero mais fascinante da literatura.
Nenhum comentário:
Postar um comentário