Hoje nós vamos falar sobre um livro de um escritor que eu nunca havia lido antes. A lenda H.G. Wells,
em O homem Invisível. Bom, antes que você, leitor(a), leia o resto do presente
texto, adianto: em função do vício e de ter devorado em tão pouco tempo, não me
conformei e, no momento, já estou lendo outro livro do mesmo autor. Daí se
deduz a qualidade da obra.
SINOPSE
A novela conta a história de um homem misterioso (Griffin) que chega a
uma pequena aldeia, chamada Iping, mais especificamente numa estalagenzinha, na
qual ele passa dias inteiros trancado, pesquisando, escrevendo, falando sozinho
e apresentando um comportamento pra lá de arrogante, antissocial e oculto.
A primeira cena do livro é icônica (não vi o filme, mas merecia ser
retratada fielmente). A reação imediata da estalajadeira — e, aliás, não só
dela — foi de estranhamento, uma vez que o enigmático indivíduo não tirou o seu
sobretudo (era inverno, mas na Inglaterra é costume tirar o casaco ao entrar
num aposento), nem o seu chapéu e, pasme, o rosto estava inteiramente coberto
por bandagens. A única parte do corpo à vista era a ponta do nariz. Aliás, para
se ter uma imagem completa do homem, basta acrescentar ao que já foi dito um
óculos azul (ao menos eu imaginei desta cor por algum motivo, talvez Wells
tenha realmente especificado e eu esteja confuso). Ou seja, trata-se de uma
pessoa intrigante a níveis absurdos.
Em vista disso, a pacata vida da aldeia ferve em especulações. De onde
teria vindo? Quem é o sujeito? Neste quadro, Wells exibe a sua maior qualidade
(ao menos neste livro), que é a de apresentar os fatos populares com um olhar
prosaico. Nem o próprio leitor está bem situado na história, o narrador
apresenta apenas o que, no máximo, a estalajadeira (a pessoa mais próxima dele,
evidentemente) percebe. Isto é, o olhar do leitor é o olhar dos moradores da
vila.
Daí que se apresentam, como Wells coloca, as “escolas de pensamento”.
Algumas dizem que o sujeito é um simples malfeitor fugindo à polícia, outros que
ele está lá justamente para planejar um assalto ou algo do tipo. Uma pequena
população, ainda, mas já depois de algum tempo de sua chegada, afirmam que ele é
uma aparição fantasmagórica.
A invisibilidade é um tema que, sobretudo no século XIX, suscitou grande
fascinação. No entanto, vários foram os dilemas apresentados a Griffin logo quando se tornou invisível. Tinha que ficar com todo o corpo nu (pois seria estranho
ver roupas andando sozinhas por aí) e passar dias inteiros de jejum, a menos
que se escondesse após as refeições, porque a comida se mantinha visível
enquanto não estava digerida, além de sofrer por uma solidão irremediável.
Griffin resolve lidar com isso de uma maneira bem particular. Tem gênio
pra lá de egoísta, e pretende instaurar um reinado de terror para enriquecer e
exercer dominação. Sua megalomania só se agrava com a invisibilidade e o que
para muitos é um sonho, o homem invisível descobriu na prática ter sido a sua
deteriorização moral e psicológica.
O QUE FICOU DO QUE
PASSOU
A edição que eu li foi um ebook do Kindle. Poucas vezes me decepcionei
tanto com um prefácio. Que coisa horrível! Dá vontade de gritar para o mundo:
não leiam essa introdução pelo bem que vocês têm ao mistério dos enredos. Você
começa a ler tranquilamente, quando, num descuido, a história inteira é contada
em um parágrafo. Fiquei me iludindo durante todo o livro, mesmo contra todas as
evidências, de que não, não seriam revelações cruciais as que eu li, não se
referem à história; mas sim, eram sim. E eu, eu mesmo, que há mais ou menos um
ano finalmente me convenci de que os prefácios são essenciais, de que não mais
leria um livro sem conferi-los... quebrei a cara.
Mas, positivamente, as frases claras e concisas, a economia de detalhes
e consequente objetividade (que desagrada a muitos; não a mim), o jeito à lá
cronista de contar histórias são apenas umas das qualidades que notei em Wells.
Não é alguém a se procurar caso queira encontrar personagens que lhe dêem o
segredo da vida. Não. Mas, caso esteja começando a ler ou mesmo se quer relaxar
após a leitura de algo penoso, ta aí uma ótima pedida.
Agora sei o escritor que indicarei nos próximos meses aos que me
pedirem, pois Wells mistura a simplicidade do imaginário popular com uma enorme
complexidade e pesquisa científica para embasar a trama. Verdadeiramente,
fiquei fissurado.
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